Direito Empresarial
CLUBES DE FUTEBOL E O ACESSO À RECUPERAÇÃO JUDICIAL A PARTIR DA LEI N° 14.193/2021 (LEI DA SOCIEDADE ANÔNIMA DO FUTEBOL)
Última atualização 0 segundo • 4 min de leitura
Uma conversa com
DE PAIXÃO NACIONAL A NEGÓCIO BILIONÁRIO
O futebol no Brasil, que surgiu no final do século XIX, rapidamente se expandiu da elite para as classes operárias e comunidades marginalizadas, tornando-se uma paixão nacional. Inicialmente, os clubes eram associações civis sem fins lucrativos, geridos por voluntários e focados no lazer e na confraternização.
No entanto, com a evolução do esporte, o futebol se transformou em um negócio lucrativo. Um estudo da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) em parceria com a consultoria "EY" revelou que, em 2019, o futebol movimentou R$ 52,9 bilhões, o que representava 0,72% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil. Esse cenário de alta lucratividade tornou o modelo de associação civil economicamente obsoleto e improdutivo.
A CRISE NO FUTEBOL BRASILEIRO
A fragilidade econômica dos clubes foi acentuada pela pandemia de COVID-19. A ausência de público nos estádios, a suspensão de jogos e a redução de receitas provenientes de patrocínios e assinaturas de sócio-torcedores levaram muitos clubes a um cenário de superendividamento. Um estudo do Grupo Globo apontou uma diferença de 80% entre a receita esperada e a realidade em 2020, evidenciando a necessidade urgente de uma renovação na estrutura empresarial dos clubes brasileiros.
SURGIMENTO DA LEI DA SAF
Para enfrentar essa crise, foi promulgada a Lei nº 14.193, em 6 de agosto de 2021, que instituiu a Sociedade Anônima do Futebol (SAF). A Lei da SAF estabelece normas para a constituição, governança e transparência, além de regular os meios de financiamento e o tratamento dos passivos dos clubes. A criação da SAF visa impulsionar a economia dos clubes, permitindo a captação de investimentos, a exploração de direitos de propriedade intelectual e a obtenção de receitas com a transação de direitos econômicos de atletas.
A Sociedade Anônima do Futebol pode ser constituída de três maneiras: A primeira opção é a transformação da associação civil em SAF, onde todos os associados se tornam acionistas. A segunda alternativa é a cisão, onde os ativos relacionados ao futebol são transferidos para uma nova SAF, resultando na coexistência de duas entidades distintas. A terceira possibilidade é a criação de uma SAF sem qualquer vínculo com o clube original.
ACESSO DOS CLUBES À RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Uma das inovações mais significativas da Lei da SAF é a possibilidade de os clubes de futebol acessarem regimes de insolvência, como a recuperação judicial e a extrajudicial, regidos pela Lei nº 11.101/2005. A recuperação judicial é um mecanismo que oferece um "respiro" para empresas em crise financeira, permitindo a renegociação de dívidas com credores e a preservação das atividades da empresa, de empregos e da arrecadação tributária. A Lei da SAF, em seu artigo 13, aborda expressamente essa possibilidade, permitindo que clubes e pessoas jurídicas originais utilizem a recuperação judicial ou extrajudicial.
O acesso à recuperação judicial não exige que o clube se transforme em uma SAF. O artigo 25 da Lei nº 14.193/2021 estabelece que o clube, ao exercer atividade econômica, é considerado parte legítima para solicitar a recuperação judicial ou extrajudicial, submetendo-se à Lei nº 11.101/2005. A lei também equipara a associação que pratica futebol de forma habitual e profissional a um empresário, após a sua inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis, o que lhe confere o direito de acessar os institutos de insolvência.
O caso do Figueirense Futebol Clube é um exemplo prático dessa mudança. O clube se tornou o primeiro a ter sua legitimidade reconhecida para o pedido de recuperação judicial, mesmo sendo uma associação civil. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina entendeu que as atividades do clube são típicas de uma empresa, com uma atividade econômica organizada, o que justificava o acesso ao regime de recuperação judicial.
CONCLUSÃO
Esse precedente abriu caminho para que outros clubes, como Chapecoense, Paraná e Joinville, também recorressem à recuperação judicial mesmo sem se tornarem SAFs. Grandes clubes, como Cruzeiro e Coritiba, também buscaram a recuperação judicial, mas optando pela conversão em SAF. Portanto, A Lei nº 14.193/2021, que criou a Sociedade Anônima do Futebol (SAF), representa um avanço na gestão dos clubes brasileiros ao permitir sua adequação a um modelo empresarial mais atrativo para investimentos. Além disso, a lei possibilita que os clubes em superendividamento acessem regimes de insolvência, como a recuperação judicial, para renegociar dívidas e se reestruturar.
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