Direito Administrativo
Como os Microempreendedores Maranhenses Podem Conquistar o Mercado das Licitações Públicas
Última atualização 0 segundo • 10 min de leitura
Uma conversa com
Introdução
O universo dos microempreendedores no Maranhão compõe um segmento vital para a economia local, especialmente em setores como comércio e serviços. Segundo dados da Junta Comercial do Maranhão (JUCEMA), quase 90% das empresas registradas no estado são micro e pequenas, refletindo o papel central dessas iniciativas na geração de emprego e renda. Contudo, apesar de sua importância, muitos microempreendedores enfrentam dificuldades para acessar mercados formais de compra, especialmente as licitações públicas, que representam uma oportunidade significativa de diversificação e ampliação de suas receitas.
A Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, instituiu o novo marco legal das licitações e contratos administrativos no Brasil, trazendo dispositivos que visam favorecer a participação de micro e pequenas empresas, com tratamento diferenciado e simplificado. No entanto, o desconhecimento das regras, a complexidade burocrática e a falta de apoio técnico ainda limitam a inserção efetiva dos microempreendedores maranhenses nesse ambiente.
Este artigo tem como objetivo analisar o panorama das licitações públicas no Maranhão sob a perspectiva dos microempreendedores, detalhando os principais requisitos legais para participação, os desafios enfrentados e as estratégias para garantir a conformidade e o acesso a esse importante mercado. Busca-se, assim, contribuir para a construção de um ambiente mais inclusivo e favorável à sustentabilidade dos pequenos negócios no estado.
1. O mercado de licitações públicas: conceito, relevância e panorama no Maranhão
Licitação é o procedimento administrativo formal que a Administração Pública utiliza para contratar bens e serviços com terceiros, garantindo princípios como a isonomia, a transparência e a eficiência (BRASIL, 2021). No Maranhão, os recursos públicos destinados a compras e contratações representam parcela expressiva do orçamento estadual e municipal, o que traduz uma oportunidade real para que micro e pequenas empresas acessem novos clientes e ampliem suas fontes de receita (TCE-MA, 2023).
Apesar disso, dados do Tribunal de Contas do Estado do Maranhão (TCE-MA, 2023) indicam que a participação dos microempreendedores nas licitações ainda é limitada, sobretudo em municípios do interior, devido a barreiras como desconhecimento das regras, dificuldade de cumprimento das exigências documentais e acesso limitado à infraestrutura tecnológica.
O fortalecimento da participação dos MEIs no mercado de compras públicas é um fator estratégico para a economia local, pois contribui para a geração de emprego, o fomento à economia regional e o aumento da concorrência, resultando em melhores preços e qualidade para a Administração (SEBRAE, 2022).
2. A legislação aplicável: Lei nº 14.133/2021 e benefícios para microempreendedores
A nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021) representa um avanço no ordenamento jurídico brasileiro ao instituir normas modernas e mecanismos que facilitam o acesso das micro e pequenas empresas às compras públicas. Entre os dispositivos relevantes, destacam-se os artigos que garantem tratamento diferenciado e favorecido para esses empreendedores, buscando estimular sua participação efetiva (BRASIL, 2021).
O artigo 48 da lei estabelece, por exemplo, a preferência para contratação de microempresas e empresas de pequeno porte, inclusive com possibilidade de adjudicação privilegiada em casos de empate, desde que atendam aos requisitos técnicos (BRASIL, 2021). Além disso, a lei contempla a possibilidade de contratação direta para valores inferiores a determinados limites, reduzindo a burocracia para pequenos negócios.
Modalidades como o pregão eletrônico têm sido amplamente utilizadas para ampliar a transparência e o acesso, permitindo que os microempreendedores participem mesmo sem presença física no local da licitação, o que é especialmente relevante para aqueles situados no interior do Maranhão (Portal Compras, 2024).
Entretanto, para usufruir desses benefícios, é fundamental que os microempreendedores estejam atentos às exigências documentais e processuais, o que demanda conhecimento e suporte técnico para garantir a conformidade.
3. Requisitos legais para participação e conformidade documental
A participação em processos licitatórios exige que os microempreendedores estejam atentos a uma série de requisitos legais, que vão desde a documentação básica até o cumprimento de obrigações acessórias. Embora a Lei nº 14.133/2021 traga avanços que facilitam o acesso das micro e pequenas empresas, o cumprimento dessas exigências é essencial para garantir a regularidade e evitar desclassificações.
Entre os documentos básicos exigidos estão as certidões negativas de débitos junto à Receita Federal, INSS e Fazenda Estadual ou Municipal, além de comprovações de regularidade fiscal e trabalhista. Para microempreendedores individuais (MEIs), o sistema simplificado de tributação — como o Simples Nacional — facilita o acesso a essas certidões, porém é preciso manter a situação cadastral atualizada e os pagamentos em dia (BRASIL, 2021; SEBRAE, 2022).
Adicionalmente, é necessário estar cadastrado nos sistemas eletrônicos de compras públicas, como o ComprasNet e os portais estaduais ou municipais, o que demanda certa familiaridade com plataformas digitais. Muitos MEIs encontram dificuldades nesse ponto devido a limitações de infraestrutura tecnológica e capacitação, principalmente no interior do Maranhão (TCE-MA, 2023).
Outro aspecto importante é o cumprimento das obrigações acessórias, como a emissão regular de notas fiscais eletrônicas e a celebração adequada dos contratos administrativos quando vencedores da licitação. A não observância desses requisitos pode acarretar sanções que vão desde multas até impedimentos para futuras contratações (BRASIL, 2021).
Por isso, a conformidade documental deve ser vista não como um mero formalismo, mas como uma garantia fundamental para a participação segura e sustentável no mercado público.
4. Desafios enfrentados pelos microempreendedores no Maranhão para participar das licitações
O acesso dos microempreendedores maranhenses às licitações públicas enfrenta desafios que vão além da legislação, envolvendo fatores estruturais e práticos. Entre as principais dificuldades destacam-se:
Burocracia e complexidade normativa: A multiplicidade de exigências documentais e procedimentos, ainda que flexibilizados para pequenos negócios, pode ser intimidadora para empreendedores sem suporte jurídico especializado (TCE-MA, 2023).
Limitações de infraestrutura tecnológica: A insuficiente cobertura de internet banda larga e a baixa familiaridade com sistemas eletrônicos dificultam a inscrição e o acompanhamento dos processos licitatórios, especialmente em municípios do interior (ANATEL, 2023).
Capacitação técnica e jurídica insuficiente: Muitos microempreendedores desconhecem os princípios básicos da nova Lei de Licitações e os direitos que lhes são garantidos, o que os impede de se preparar adequadamente para competir (SEBRAE, 2022).
Capacidade financeira e operacional restrita: A ausência de recursos para garantir garantias contratuais, executar contratos complexos ou atender a exigências técnicas limita a competitividade dos MEIs (BRASIL, 2021).
Riscos jurídicos e reputacionais: O desconhecimento dos procedimentos e obrigações pode levar a falhas que acarretam penalidades administrativas e afastam o empreendedor do mercado público (TCE-MA, 2023).
Reconhecer esses desafios é fundamental para desenvolver políticas e estratégias que efetivamente apoiem a participação dos microempreendedores nas licitações, ampliando a inclusão e a justiça econômica.
5. Estratégias e recomendações para ampliar a participação e garantir a conformidade
Para superar os desafios que limitam a inserção dos microempreendedores maranhenses nas licitações públicas, é imprescindível o desenvolvimento de estratégias integradas, que envolvam capacitação, tecnologia, apoio institucional e simplificação dos processos.
Capacitação técnica e jurídica
Promover programas de formação direcionados aos microempreendedores é fundamental. Parcerias entre órgãos como SEBRAE, universidades locais e Defensoria Pública podem oferecer cursos e oficinas com linguagem acessível, abordando temas como: conceitos básicos da nova Lei de Licitações, documentação exigida, uso das plataformas eletrônicas e elaboração de propostas. O modelo “formar-formadores” pode multiplicar esse conhecimento em comunidades e municípios, ampliando o alcance (SEBRAE, 2022).
Apoio tecnológico e acessibilidade
É necessário ampliar o acesso às ferramentas digitais, com a disponibilização de tutoriais, suporte técnico e pontos de atendimento físico ou virtual para auxiliar na inscrição e acompanhamento dos processos licitatórios. O investimento em infraestrutura de internet banda larga, especialmente nas regiões interioranas do Maranhão, é um requisito estrutural essencial para garantir a inclusão digital dos pequenos negócios (ANATEL, 2023).
Simplificação e desburocratização
Embora a Lei nº 14.133/2021 já preveja mecanismos de simplificação para micro e pequenas empresas, os entes públicos devem adotar práticas administrativas que facilitem o acesso, como a criação de portais unificados e a padronização de documentos. Incentivar o uso de modelos simplificados e a flexibilização documental, sem comprometer a segurança jurídica, é um caminho importante (BRASIL, 2021).
Apoio institucional e integração intersetorial
A articulação entre governo estadual, prefeituras, tribunais de contas, entidades de apoio ao empreendedorismo e o sistema de justiça pode criar redes de suporte que ofereçam consultoria jurídica gratuita, esclarecimentos sobre obrigações e canais de mediação para resolução de conflitos. A criação de núcleos especializados em licitações para MEIs pode minimizar riscos e aumentar a confiança dos pequenos empreendedores (TCE-MA, 2023).
Incentivos e políticas públicas direcionadas
O estabelecimento de políticas de incentivo, como priorização nas contratações públicas, linhas de crédito específicas e micro-subvenções para adequação documental, pode ampliar a capacidade de participação dos microempreendedores. A certificação de conformidade simplificada para MEIs em licitações pode também servir como diferencial competitivo no mercado público (SEBRAE, 2022).
Conclusão
A participação dos microempreendedores maranhenses nas licitações públicas representa uma oportunidade significativa para a expansão de seus negócios e a diversificação de suas fontes de receita. Entretanto, essa participação enfrenta desafios jurídicos, técnicos e estruturais que exigem uma abordagem integrada e humanizada.
A nova Lei nº 14.133/2021 oferece dispositivos que favorecem esses empreendedores, mas o conhecimento e a conformidade são condições indispensáveis para usufruir dessas vantagens. Assim, é essencial que o poder público, em parceria com instituições de apoio, desenvolva ações concretas de capacitação, simplificação, suporte tecnológico e incentivos econômicos.
Somente por meio da construção de um ambiente favorável e inclusivo será possível transformar o mercado público em um instrumento efetivo de fortalecimento do microempreendedorismo no Maranhão, promovendo justiça econômica, desenvolvimento regional e sustentabilidade para milhares de famílias.
Referências
BRASIL. Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021. Institui a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Diário Oficial da União, Brasília, 1 abr. 2021. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14133.htm. Acesso em: 8 ago. 2025.
COMPRAS.GOV.BR. Portal de Compras Governamentais. Disponível em: https://www.gov.br/compras/pt-br. Acesso em: 8 ago. 2025.
SEBRAE. Relatório Anual sobre Microempreendedorismo e Compras Públicas. Brasília, 2022. Disponível em: https://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/relatorios. Acesso em: 8 ago. 2025.
TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DO MARANHÃO (TCE-MA). Relatório sobre participação de micro e pequenas empresas em licitações estaduais e municipais, 2023. Disponível em: https://www.tce.ma.gov.br/relatorios. Acesso em: 8 ago. 2025.
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